Infelizmente, as ruas do país não se encheram ontem em repúdio ao crime contra ele perpetrado, ainda que tenha havido algumas manifestações expressivas. Muito pouco, ainda, para nos habilitar a virar o jogo. Mesmo entre muitos de nós, “politizados”, parece não haver ainda a compreensão necessária da importância das mobilizações. O ato de Belo Horizonte dessa sexta-feira comprova isto.

Lula fez um discurso que vai ficar na história. De cabeça erguida, com valentia, sem aparentar qualquer abatimento, mostrou pra nação o significado de sua prisão. Apontou o dedo para seus algozes, mas deixou claro os interesses que eles representam: a manutenção dos privilégios históricos das elites, a desconstrução dos direitos alcançados nos governos do PT, o desmonte da soberania nacional, tudo isto às custas do comprometimento dos espaços democráticos. Não deixou de mirar no papel decisivo da mídia no golpe e em toda esta trama, nominando, expressamente, a Globo, a Record, a Bandeirantes e a Veja, enfatizando a perseguição que sofre da primeira. Não poupou o MP e o Judiciário, tendo a cautela necessária ao referir-se aos ministros do Supremo Tribunal Federal. Defendeu as estatais e paraestatais, em particular a Petrobrás, a Caixa, o Banco do Brasil, o BNDES; apoiou, sem meias palavras, as ocupações de terras urbanas e rurais; mostrou, de maneira categórica, a necessidade de união das esquerdas; elogiou, sem economia, as lideranças novas emergentes, nas figuras de Boulos e Manuela.

Lula não só vai para a cela com a cabeça erguida. Nos deixa, também, com a moral elevada. Vai sair de lá, mais cedo ou mais tarde, com o peito estufado, como ele mesmo disse. Cabe a nós estufarmos o nosso, para que o intervalo de tempo da castração de sua liberdade seja o menor possível, e para que possamos superar este dia sombrio que marca, indelevelmente, um dos momentos mais trágicos da história do Brasil “republicano”.

Artigo de Eduardo Campos, jornalista e advogado em Belo Horizonte para o site Jornalistas Livres.